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Há 90 anos, o Brasil queimou milhões de sacas de café

Entre 1931 e 1944, o Brasil queimou 78,2 milhões de sacas de café. Isso é uma quantidade impressionante que levaria quase 4 anos para os brasileiros consumirem nos dias de hoje.

O café é parte indissociável do cotidiano brasileiro desde o século XIX. O café está tão entrelaçado com a cultura brasileira que, em português do brasil, a refeição conhecida como “breakfast” é referida como “Café da Manhã”.

Então, como o Brasil chegou ao ponto de queimar  milhões de sacas de café em seus portos, armazéns e fazendas? A resposta está no significado político e econômico do café na vida e nos meios de subsistência dos brasileiros.

Contexto Histórico

A história da queima do café envolve um contexto histórico que remonta muito antes da primeira chama ser acesa, em 1931.

Na década de 1870, o Brasil começava a se separar da monarquia no caminho para a formação de uma república, que veio oficialmente com o golpe militar de 1889 que derrubou o imperador Dom Pedro II.

Ajudando a articular esse movimento político estavam grandes produtores de café e latifundiários que buscavam indenização pela abolição da escravatura, bem como subsídios para trazer imigrantes europeus para a mão-de-obra cafeeira.

O mandato do segundo presidente civil do país, Campo Sales, começou em 1898, e com ele veio um regime que ficou conhecido como “República do café com leite”.

Esse nome foi derivado das atividades dos estados econômica e politicamente dominantes, e mais populosos da época: Minas Gerais (leite) e São Paulo (café).

Nesse período, a força política dos grandes proprietários de café levou o governo a incentivar mais cultivos, disponibilizar linhas de crédito e criar instituições para promover a cafeicultura, a pesquisa e o comércio.

1966

Uma superabundância de café fez com que os preços do café caíssem. Isso levou os governadores de três estados produtores de café a se engajarem em um esforço de valorização, usando empréstimos internacionais para comprar estoques excedentes de café e, assim, estabilizar ou aumentar os preços do mercado internacional.

Esse equilíbrio político e econômico continuou por décadas, com o Brasil dominando a produção mundial de café. Ao mesmo tempo, era prática comum que as lavouras de café fossem armazenadas por anos, uma vez que os conceitos sobre qualidade não haviam evoluído para os padrões atuais.

Crash econômico de 1929

Em 1929, a Grande Depressão afetou severamente a economia brasileira, fortemente dependente das exportações de café. Naquela época, mais de 50% do valor dos produtos exportados do Brasil estava no café, contra cerca de 2,7% hoje.

Os Estados Unidos eram de longe o maior mercado de exportação de café do Brasil na época, e a quebra do mercado de ações dos EUA e a subsequente perda de atividade econômica reduziram as exportações totais de café brasileiro, e o valor, por anos.

No início de 1929, uma saca de café no Brasil valia 200 mil réis em moeda nacional; No entanto, até o final do ano, a mesma saca valia apenas 10% disso.

O acidente foi um dos inúmeros fatores que levaram o país, em 1930, a um golpe militar, que derrubou o presidente e seu sucessor – pondo fim à “república do café com leite”.

Getúlio Vargas assumiu o poder e, a princípio, tentou romper os laços do governo com os grandes cafeicultores rurais, mas a influência permaneceu forte.

No entanto, o equilíbrio econômico permaneceu delicado. Até o crash de 1929, os líderes do Brasil mantinham a crença de que sua força agrícola em café, cacau, algodão e borracha criaria uma espécie de vínculo eterno com os parceiros comerciais de longa data do país, os EUA e a Europa.

Crise

A crise econômica provou que essa crença estava errada. Alguns historiadores chamaram a economia brasileira na época de “economia das sobremesas”, já que muitas delas não estavam associadas a bens essenciais. Também nessa época, os custos de exportação estavam subindo e outros países começaram a investir na produção de café.

Enquanto isso, décadas de influência dos grandes produtores rurais na política brasileira acabaram desincentivando a industrialização em prol do desenvolvimento rural. Em suma, as commodities eram vendidas para exportação enquanto os manufaturados eram importados.

Vamos Queimar

Com o mercado de exportação em colapso, e sacas de café empilhadas em armazéns de safras anteriores, os preços naturalmente caíram.

A economia ainda era muito baseada em café para exportação, então o governo de Getúlio optou por aumentar as taxas alfandegárias nacionais e comprar o café armazenado para queimá-lo.

Uma comissão de membros da cadeia do café foi criada para tomar decisões, elaborar leis e supervisionar a destruição dos grãos. No início, a ideia era destruir o café de baixa qualidade, depois o estoque de café mais antigo; no entanto, logo até mesmo grãos novos de qualidade também foram destruídos.

Em tese, isso aumentaria o valor do produto no mercado internacional, reduzindo os custos de abastecimento e armazenamento, em grande parte financiados por empréstimos externos. A queima de estoques não foi uma decisão unânime e popular. Um novo ministro da Fazenda, Oswaldo Aranha, avançou com o programa em 1932.

Café Queimado

Naquele ano, aproximadamente 12% dos estoques foram queimados. Em 1937, 70% do estoque anual foi incendiado. Em média, 27% dos estoques anuais foram destruídos entre os anos 1931-44.

Os ciclos de queima do café ocorreram principalmente na grande cidade portuária de Santos, onde atualmente mais de 75% de todo o café ainda sai do Brasil até hoje.

Os jornais da época noticiavam o cheiro de café queimado que era carregado pelo vento para cima e para baixo no litoral paulista. Enormes nuvens de fumaça de café podiam ser testemunhadas a quilômetros de distância.

Enquanto a destruição ganhou as manchetes, impedir a produção também se tornou uma realidade. Durante cinco anos, a partir de 1931, os produtores foram desincentivados por um novo imposto sobre as árvores.

Em 1932, um Conselho Nacional de Estabilização do Café foi criado para lidar melhor com todas as questões relacionadas ao café, embora as relações internacionais estivessem tensas à medida que as acusações de violações antitruste e “extorsão” surgissem como resultado da queima do estoque.

Eventualmente, o volume de café enviado para as queimadas foi tão grande que os trabalhadores portuários começaram a jogar grãos no mar para reduzir os estoques. Algumas pessoas, então, começaram a coletar esse “café marinho” antes de secá-lo, ensacá-lo e depois revendê-lo – um crime.

Para não ir completamente para o lixo, o café destinado à destruição também foi usado como fonte de combustível experimental em algumas fábricas e caldeiras industriais.

Um relato de jornal de 1932 detalhou um experimento em que 2.912 quilos (6.420 libras) de café deveriam abastecer uma locomotiva a vapor. O café verde abasteceu o forno por duas horas enquanto movimentava o trem de 610 toneladas.

Em retrospectiva

Podemos agora olhar para trás como um momento fascinante na história do café brasileiro – uma espécie de experimento único – embora tenha tido implicações muito reais.

Muitos economistas e historiadores especularam que o mercado teria se regulado naturalmente com o passar do tempo após a crise econômica de 1929.

Todo o café destruído não gerava impostos de exportação, por menores que fossem. O custo para o governo brasileiro foi imenso. Os agricultores foram pagos, mas muitos deles faliram de qualquer maneira, pois os preços permaneceram baixos por anos, muitos tinham dívidas e pouco acesso a crédito.

Na época, uma redução na oferta doméstica pode ter parecido uma opção atraente para alívio de preços de longo prazo. No entanto, é provavelmente mais um exemplo de que não há soluções fáceis para muitos dos problemas mais complexos do café.

A extrema volatilidade de preços estimulada pelos recentes eventos de geadas que, infelizmente, afetaram milhares de produtores no Brasil é outro exemplo de por que decisões precipitadas do mercado não devem ser tomadas. Enquanto o mercado exige respostas e ações imediatas, os interesses dos produtores de café e do setor como um todo são melhor atendidos por meio de uma consideração cuidadosa e remediação com base nas condições reais no terreno.

 

Tradução Livre do artigo: “90 Years Ago, Seeking Salvation, Brazil Burned Billions of Pounds of Coffee”

Autor:

Jonas Leme Ferraresso holds a degree in agronomy from São Paulo State University (UNESP). He has worked as a coffee farmer and as a Agronomist (Boa Esperança Coffee Farm), as a Roaster (Artesan Coffee Solutions), as a cupper and roaster (Amparo Rural Union), and as a consultant. He is based in Serra Negra, São Paulo, Brazil.